(texto antigo)
A Vingança dos Nerds
Pra quem mora em Nova Iorque ter um Apple já não é nem mais uma questão de comodidade – é uma necessidade estilística. Andar pela rua carregando um arcaico Disc-Man é uma afronta a moda dominante de iPods da maioria dos habitantes - um pode se sentir andando de como um sujeito que anda vestido com uma camiseta do Bon Jovi em meio a uma multidão em um show do Motorhead.
Eu como sempre quis ser um cara fashion comprei um apple - um Powerbook G4; mas como eu sou chinelão, comprei usado – 800 dólares. O que foi uma burrice visto o que viria a seguir. De cara já gastei mais 130 dólares pra botar um cartão Airport pra que eu pudesse ter Internet sem cabo. Bom, ate aí tudo bem, visto que eu comecei a fazer parte daquela malandragem nova-iorquina, que se aloja em um café e sintoniza seu laptop na internet e fica por lá escrevendo, escutando musica ou sei lá eu o que.
Passou um mês e o computador começou a dar pau. Nada pra me apavorar, trancava as vezes. E foi assim por mais um mês. Ai o negocio começou a ficar assustador. O computador iniciava, mas a tela não ascendia. Foi então que eu descobri que num certo angulo, botando ele em cima das minhas coxas a tela ascendia. Mas dai tinha um outro problema - eu não poderia mexer o computador, pois o mais leve movimento faria com que ele congelasse novamente. O que criou uma rotina esquisita em que eu ligava o computador em cima das minhas coxas e levava ele com todo cuidado ate o topo da mesa. Nem sempre funcionava. As vezes eu simplesmente ligava ele e funcionava sem problemas, mas tinha vezes que ele teimava.
Um dia levei o laptop na loja da Apple no SoHo. O técnico levantou ele no ar, virou de cabeça-pra-baixo e nada, funcionou sem problemas. "Filho duma puta" pensei olhando praquele computador ligando e desligando sem dar um "ai" sequer. Depois da quarta tentativa ligando e desligando ele eventualmente deu um pau, e depois de um rápido exame disse que ali nada poderia ser feito, a não ser que eu quisesse mandar pra fabrica da Apple em Kentucky. "Tem garantia?" perguntou o nerd da Apple. Eu sorri e respondi "imagino que não". Queria dar com a cabeça na parede. Custaria uns trezentos e poucos pra mandar arrumar. Resolvi ficar com aquela porcaria do jeito que estava.
Se passou dois meses e o computador pareceu ter dado uma melhorada. Me acostumei em nem tentar mexer nele - mas pelo menos agora eu botava ele em cima da mesa e ele ligava quase sempre. Ate que na semana passada ele voltou a piorar. Só que dessa vez ele foi ficando cada vez pior, trancava com a mais leve batidinha na mesa, e eu já teclava o teclado com toda a delicadeza possível a um ser que tem os dedos do tamanho dos meus.
Sexta-feira foi o último dia que eu fiz ele funcionar, depois disso comecei a me deprimir, ele ligava mas ficava uma tela cinza ou azul. Eu implorava por um sinal de vida pra que eu pudesse fazer um backup das minhas músicas e textos, e nada da geringonça funcionar.
Hoje de manhã ao chegar ao trabalho, me mandaram levar o iPod de um dos meus chefes ate a Teskserv, uma loja com assistência técnica autorizada da Apple na Rua 23. Me disseram que ele estaria na sessão de computadores quebrados. Resolvi já botar o meu na fila pra uma avaliação. Ia demorar uns quarenta minutos pra eles me atenderem, peguei uma ficha e fui até a esquina depositar uma grana no Citibank. Ao voltar tive de esperar mais uns quinze minutos. Meu chefe ainda tava aguardando ser chamado - o iBook dele tinha um problema parecido, só – claro; o dele tinha garantia. Um nerd magrinho analisou a aquela minha porqueira velha. O diagnóstico era o mesmo, dava pra arrumar se mandasse pra Apple em Kentucky. Sairia pela bagatela de 395 dólares. Voltei até o escritório e comecei a pensar. Liguei pro meu pai pra debater o assunto. Decidimos que eu pagaria os tais 395 e que depois eu venderia essa porcaria por uns 800 paus. E que com a grana que eu tivesse eu compraria um novo. Eu poderia ter comprado um novo por 1300 dólares - que é o que, no final das contas, vai custar essa brincadeira toda. Mas fazer o que – agora a cagada já tava feita. A idéia agora era adquirir um G5, mas ate lá tem tempo.
Voltei na loja e esperei na fila de novo . Veio um outro geek. Tive que explicar tudo de novo. O cara olhou pro computador ligou, uma vez e nada, ligou outra vez e não e que a merda ligou. Tirei o meu Drive externo da mochila e pedi pro cara pra um minuto pra fazer um backup dos meus arquivos. Por alguns instantes eu rezei pra que não aparecesse alguma mensagem que dizia "Transferindo Arquivo loira_gostosa_peituda_gemendo gritando_que_nem_uma doida_ sendo comida por um cara com_pau_do_tamanho enorme que parece mais de um jumento.mpeg". Ou alguma esquisitísse dessas. Enfim. Pude salvar todos os meus arquivos mais importantes. O nerd pegou o computador e levou pra uma área mais ao fundo da loja onde um japonês começou a bisbilhotar no computador. O nerd volta do fundo com o computador mais uma vez. Dessa vez ele me mostra um amassadinho na lateral e um risco na parte de baixo, que eu nem tinha percebido e me larga a noticia bombástica. O pessoal da Apple em Kentucky vai ver esse computador e que há a possibilidade de eles acharem, caso o técnico acorde de mau humor, que o computador foi "abusado", e que sendo assim, eles não fariam o concerto por esse valor de 395. O valor do concerto de um computador "abusado" iria para uns 1020 dólares. E tem mais, caso os caras decidam que os amassadinhos na lateral e o risco em baixo indicam de certo um “abuso”, eu poderia optar por não fazer o concerto, mas que daí eu teria de pagar 200 dólares que viria a ser uma taxa por recusar o computador.
Uma longa pausa. Eu respiro fundo. O Nerd me olha de um jeito, "É, meu velho". Eu pressiono os lábios e faço um "Mmmm". Ficamos eu e o nerd nos encarando por uns bons 15 segundos. "Fuck it" falei pro nerd.
Vou mandar essa merda e pagar os 395 e se eles não quiserem eu ligo pra eles e fico pentelhando pelo telefone ate eles encherem o saco da minha voz. Fui ate o Citibank na esquina e tirei 400 paus da minha conta. Paguei o geek e saí de cabeça entre os ombros olhando para os iPods da vitrine e uma câmera Cannon XL2, lamentando pra minha consciência.
Ao ir embora pra casa, coloquei o CD do Elliot Smith no disc-man pra ver se me animava um pouco. Tava chovendo na rua. O CD começou a pular.
Hoje:
Depois do concerto, a merda do computador funcionou como novo por um tempo e voltou a ficar capenga logo mais. Deixei el nos Estados Unidos na casa de uma ex-namorada.
Morando em Porto Alegre, tenho um MacBook Pro, não tenho o G5, tenho um iPod de 30 GB e a câmera Cannon XL2 é um tanto ultrapassada. Outra coisa - pra quem não sabe, o Elliot Smith se matou com uma facada no peito.
Friday, October 27, 2006
Subscribe to:
Post Comments (Atom)
No comments:
Post a Comment